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DEFENDE PROCURADOR OCTÁVIO ZILO: Raptos devem ter respostas eficazes






A CRIAÇÃO de unidades especiais de resposta, com pessoal altamente qualificado e com instrumentos que lhes permitam investigar os raptos, é apontada pelo procurador Octávio Zilo como um dos meios eficazes de prevenção e eliminação deste fenómeno, que há cerca de cinco anos vem preocupando os moçambicanos.

De acordo com Octávio Zilo, procurador da República de 1.ª, afecto à Procuradoria Provincial de Maputo, na secção criminal, e formador no Centro de Formação Jurídica e Judiciária, na área de Jurisdição Penal, como medidas eficazes contra este mal, deve apostar-se num combate cerrado da circulação de moeda fora do circuito normal do sistema monetário e financeiro, bem como a destruição imediata das armas apreendidas resultantes da prática deste crime.
Falando sobre os crimes de raptos, numa palestra havida há dias em Maputo, onde se discutiram as dinâmicas actuais da criminalidade no país, Octávio Zilo disse que se devem convidar os detentores ou possuidores ilegais de armas de fogo a devolver às autoridades competentes, mediante um incentivo monetário. Deve-se, igualmente, obrigar ao registo dos contratos de arrendamento como forma de melhor controlar as residências que têm sido usadas como cativeiro.
“É preciso investir em segurança. Mas investir em segurança não significa aumentar o número de agentes da Polícia, nem de viaturas ou armamentos. Precisamos de uma Polícia melhor e mais qualificada, treinada, motivada e mais honesta. Precisamos ainda reforçar as medidas de prevenção criminal, fortalecimento da actividade operativa da Polícia da República de Moçambique, instar as empresas de telefonia móvel a obrigar o registo dos cartões SIM, criação de uma base de dados nacional das impressões digitais, contínua formação específica de magistrados do Ministério Público e agentes da Polícia de Investigação Criminal” - apontou o procurador.
Segundo ele, estas novas medidas devem complementar as que já existem, carecendo apenas de consolidação. É neste contexto que reconhece os esforços conjugados desenvolvidos pelos órgãos de Administração da Justiça na prevenção e combate a este fenómeno criminal, que se consubstancia no reforço da capacidade operativa e investigativa da Polícia, no fortalecimento das brigadas especializadas na investigação dos crimes de rapto, na capacitação dos magistrados do Ministério Público e Judicial, bem como no incremento dos níveis de processos acusados e julgados.
“Estas medidas permitiram que no ano passado fosse registado um total de 19 casos de raptos contra 42 do ano de 2014, o que representa uma redução de 23, correspondente a 54.7 por cento. Entretanto, estes resultados não podem nos despistar, é preciso enfatizar e consolidar algumas medidas em curso e continuarmos à busca de soluções criativas para a prevenção e combate deste crime” - explicou.
RAPTOS COMEÇARAM EM 2011
PARA o procurador Octávio Zilo, foi a partir do ano de 2011 e 2012 que Moçambique começou a registar, com tendência crescente, casos reportados de raptos. Aliás, como em muitos países onde o desenvolvimento rápido das cidades e das pessoas não é proporcional, a capacidade de resposta do sector de segurança pública, o país, no seu entender, não é excepção, e começa a emergir manifestações de delitos com contornos de crime organizado.
Por ser um fenómeno que tem sempre impactos negativos, os raptos têm sido alvo de atenção na agenda da política e segurança nacional.
Entretanto, definindo o termo rapto, Octávio Zilo disse que, etimologicamente, deriva do latim raptus, é um termo que admite várias acepções. Pode tratar-se de um estado colérico que leva uma pessoa a actuar de forma impulsiva ou irracional a uma dada altura.
“O conceito de rapto também é utilizado para evocar a acção que consiste em esbulhar um indivíduo com o objectivo, em geral, de exigir um resgate para a sua libertação. O rapto consiste na privação ilegítima da liberdade de outra pessoa, recorrendo ao uso da violência ou da intimidação” - disse.
PUNIÇÃO ATÉ 40 ANOS
A PREVISÃO e estatuição do crime de rapto na Lei n.º 6/2014, de 5 de Fevereiro, foi definitivamente incorporado e consagrado no Novo Código Penal, aprovado pela lei n.°35/2014 de 31 de Dezembro que manteve a moldura penal abstracta de 20 a 24 anos de prisão maior.
Para além disso, de acordo com o procurador Octávio Zilo, o legislador de 2014 veio a reputar o crime de rapto como hediondo, sobretudo naqueles casos em que são seguidos da morte da vítima, e ainda agravou a punição dos limites de pena para 2/3 da sua duração, podendo atingir 40 anos de prisão, mas nunca excedendo a estes.
“A entrada em vigor do Novo Código Penal foi, efusivamente, aclamado por aplicadores do direito e pela sociedade em geral, pois veio responder às aspirações dos moçambicanos e da comunidade internacional, por proteger efectivamente os valores jurídicos especialmente protegidos pela lei penal” - sublinhou.
O crime de rapto acha-se tipificado no Capítulo V - Crimes contra a liberdade das pessoas, Secção I - violência contra a liberdade das pessoas, concretamente no Art. 199 do Código Penal. Explicou ainda que para que se verifique este crime “é preciso que haja violência, ameaça ou qualquer fraude contra a pessoa, com o fim de submetê-la à extorsão, violência, obter resgate, obter recompensa, constranger a autoridade pública ou terceiro a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade”.
TIPOS DE RAPTOS
O MAGISTRADO Octávio Zilo aponta duas modalidades de rapto: convencional e relâmpago. Por sua vez, segundo ele, o rapto convencional subdivide-se em rapto por estranhos, vingança, entre traficantes, político e doméstico.
“Em todas as situações, existem quatro elementos comuns que se evidenciam: a captura, o transporte e a privação ilegal da liberdade individual da vítima sem o seu consentimento; ameaça ou uso da violência, a fraude e a extorsão; a manutenção da vítima do rapto em cativeiros ou em lugares desconhecidos e, por fim, a exigência de resgate” - disse.
Para ele, rapto convencional é o que ocorre quando uma pessoa ou mais pessoas com a intenção de extorquir dinheiro ou outros valores, ou assegurar outras concessões substanciais para permitir a sua libertação. Normalmente, os executores são estranhos à vítima e às testemunhas. O rapto por vingança ocorre quando os criminosos, provavelmente, conhecem o raptado. Podem estar criminalmente relacionados.
Quanto aos raptos políticos, estes, na óptica de Zilo, transformam-se, quase sempre, em tomada de reféns. Devem ser tratados de forma diferente dos raptos convencionais, tendo em conta que ocorrem por motivações políticas. Resolvem-se, segundo o procurador, através de negociações, políticas, e os autores estão, normalmente, identificados ou conotados com determinada corrente política. As exigências podem ser de cariz político, sendo que, por vezes, também são exigidos valores em dinheiro para financiar a causa política.
Quanto aos raptos domésticos, ele explicou que podem reunir características de um rapto por estranhos. Verificam-se mais nos casos de divórcio ou separação, onde o raptado pode ser uma criança. Possibilidade de infiltração familiar ou amigos.
Por outro lado, o rapto relâmpago ocorre quando se toma uma ou mais pessoas com a intenção de forçar o acesso imediato ao dinheiro ou concessões de outro género de valores de uma empresa ou organização.
MOTIVAÇÕES E MODUS OPERANDI
NAS tipologias de rapto, quase todos têm o mesmo modus operandi. Segundo Octávio Zilo, os raptores fazem a selecção da vítima, estudo dela, selecção da fonte de informação e estabelecem o momento ideal para o cometimento do rapto.
Estabelecem ainda, segundo ele, grupos de trabalho, divisão de tarefas, meios a utilizar, escolha do lugar para o cativeiro, forma de comunicação/contacto com os familiares e a forma de pagamento e entrega do resgate.
“Na existência de grupos e específicos podemos encontrar operacionais, responsável pelo cativeiro, responsável pela negociação, recolha de informação e vigilância e contra-vigilância e grupo de branqueamento de vantagens” - explicou.
No que respeita às motivações dos raptos em Moçambique, o procurador aponta várias, destacando-se as sociais, económicas, culturais e até religiosas. “Porém, as motivações mais comuns são de natureza económica pois, tal como a maioria dos crimes actuais, os raptos são originários ou têm o seu fim último obter valores monetários. Também temos motivações de ordem social” - afirmou.
GERA MEDO E DÚVIDAS
QUANDO os raptos se generalizam, ou seja, ocorrem com muita frequência, têm como consequência o medo e as dúvidas nos cidadãos, que por sua vez leva à falta de confiança dos órgãos da administração da justiça, segundo explicou o magistrado.
Para ele, os efeitos psicológicos provocados são os que mais preocupam a nível individual, familiar e social porque podem ser crónicos e durarem a vida toda.
“As crianças que experimentaram a violência dos raptos, uma vez libertadas, apresentam distúrbios psicológicos e mudanças de comportamento bruscos que vão desde risos ou choros, falar como bebés, ou mesmo não falar, dependendo da idade, pesadelos, medo de sair de casa, não querer falar sobre o sucedido ou falar constantemente, entre outros” - referiu Octávio Zilo.
Ele ajuntou que ao nível económico os raptos propiciam o surgimento de “offshores” e uma economia paralela ilegal devido aos valores monetários que circulam fora dos parâmetros normais de circulação do capital.
“Por outro lado, quando os raptos são direccionados para empresários, podem retrair os investimentos, bem como originar ou dinamizar a profissionalização do fenómeno, com grupos a organizarem-se funcionalmente como autênticas empresas, com pessoal treinado” -explicou.

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